Sementes Certificadas: Veja as Novas Regras

A cada nova safra, o produtor rural se depara com uma decisão importante: a escolha da semente.

Essa escolha pode ser determinante para a lavoura, já que impacta o potencial produtivo, a sanidade e rentabilidade da propriedade.

O cenário regulatório brasileiro para sementes é complexo e está em constante evolução e entender essas regras evita problemas legais e garante a qualidade do insumo.

Nesse contexto, as sementes certificadas surgem como um elemento principal, oferecendo garantias e origem.

Existem várias opções disponíveis no mercado, como as sementes S1/S2, as crioulas e, infelizmente, as ilegais (piratas), cada uma com suas próprias regras e implicações.

O que são sementes certificadas?

As sementes certificadas são aquelas que passaram por um processo de produção, controle e certificação oficial garantindo a sua alta qualidade genética, física, fisiológica e sanitária.

Segundo a definição oficial do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), a certificação de uma semente é um processo longo, que inclui conhecer a origem genética do material e controlar as gerações de multiplicação.

O processo de certificação envolve inspeções rigorosas nos campos onde as sementes são produzidas, seguindo normas técnicas detalhadas pelo MAPA.

Essas inspeções verificam o isolamento da área, a pureza varietal, a sanidade das plantas, entre outros aspectos.

Dentro da classe certificada, existem categorias como Básica, Certificada de Primeira Geração (C1) e Certificada de Segunda Geração (C2), que indicam a linhagem e o número de multiplicações a partir da semente genética original.  

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Por que as sementes certificadas são importantes?

A semente é o primeiro passo de qualquer safra. Se ela não for de qualidade, todo o resto pode ficar comprometido.

É neste momento entra a importância das sementes com certificados, garantindo bom desempenho, segurança e previsibilidade.

Por mais sejam mais caras, as sementes certificadas são um investimento mais que necessário para alcançar melhores resultados no campo. Entenda:

  1. Maior potencial produtivo: Devido ao alto poder de germinação, vigor e pureza, as sementes formam lavouras mais uniformes e com maior teto produtivo;
  2. Melhor qualidade e lucratividade: Lavouras mais uniformes e saudáveis geram grãos de melhor qualidade, que podem ser vendidos por um preço maior;
  3. Garantia genética e pureza varietal: A certificação garante que o produtor está plantando exatamente a cultivar escolhida, com todas as suas características preservadas;
  4. Rastreabilidade e suporte técnico: Conhecer a origem da semente e quem a certificou dá segurança de a quem recorrer em caso de dúvidas ou problemas;
  5. Segurança fitossanitária: O controle rigoroso na produção reduz o risco de introduzir pragas, doenças ou sementes de plantas daninhas na sua área;

O investimento que nas sementes certificadas retorna, em parte, para as empresas de melhoramento genético.

Isso financia a pesquisa e o desenvolvimento de novas cultivares, mais produtivas, resistentes a doenças e adaptadas às condições locais.

Ou seja, além de gerar mais lucro, esses insumos contribuem para a evolução tecnológica da agricultura.  

O que são sementes piratas? Por que não devem ser usadas?

Em contraste direto com os benefícios das certificadas, estão as chamadas sementes piratas.

Estas são produzidas e comercializadas ilegalmente, sem qualquer controle ou certificação, geralmente no mercado informal.

O uso dessas sementes é um grande risco para a qualidade da lavoura e para a parte financeira da fazenda, além de causar outros problemas, como:

  • Mistura de cultivares: É comum que lotes piratas tenham misturas de diferentes variedades, resultando em lavouras desuniformes, com plantas de ciclos e portes diferentes, dificultando o manejo e a colheita.  
  • Disseminação de plantas daninhas: Podem carregam sementes de plantas daninhas de difícil controle, infestando a área e aumentando os custos com herbicidas.  
  • Contaminação por doenças e pragas: Podem introduzir doenças e pragas, transmitidas pelas próprias sementes ou por partículas de solo aderidas;
  • Baixa germinação e vigor: A qualidade fisiológica é incerta. Baixa germinação e baixo vigor levam a falhas no estabelecimento da lavoura, impactando a produtividade final;
  • Falta de garantia e problemas legais: Os insumos sem certificação não oferecem garantia de qualidade de semente ou identidade varietal.
  • Prejuízo à Inovação: A pirataria desestimula o investimento em pesquisa, pois as empresas não recebem o retorno devido pelo desenvolvimento de novas tecnologias.  

Ao avaliar o custo inicial de uma semente pirata, que pode parecer menor, considere os múltiplos riscos associados, como a disseminação de doenças ou a baixa germinação, que resultam em perdas de produtividade ou aumento nos custos de manejo.

Por outro lado, as sementes certificadas, mesmo com um preço maior, vêm com garantias de qualidade e sanidade que minimizam esses riscos e atingem o potencial produtivo da cultivar.

Além disso, o combate à pirataria e a preferência por sementes certificadas são importantes mas para a sustentabilidade de todo o sistema de inovação agrícola no Brasil.

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Quais as novas regras afetam o uso de sementes certificadas?

A base legal que organiza todo o setor de sementes e mudas no Brasil é a Lei nº 10.711, de 2003, conhecida como Lei de Sementes, regulamentada pelo Decreto nº 10.586, de 2020.

Juntos, estabelecem o Sistema Nacional de Sementes e Mudas (SNSM), que define as regras para registros obrigatórios, produção, certificação, análise, comercialização e fiscalização.

É um sistema complexo, mas fundamental para garantir a identidade e a qualidade do material que chega ao campo.  

Recentemente, algumas atualizações trouxeram mudanças práticas para o dia a dia. A Portaria MAPA nº 538, de 20 de dezembro de 2022 consolidou e alterou algumas normas.

Em vigor desde 1º de março de 2023, as mudanças trazidas pela Portaria 538, incluem:

1. Simplificações burocráticas

Houve uma simplificação na documentação exigida para o registro dos campos de produção de sementes.

Além disso, foi eliminada a necessidade de autorização prévia do MAPA para o transporte de sementes entre diferentes estados, desde que a carga esteja acompanhada do comprovante de inscrição do campo no MAPA e a nota fiscal detalhada.  

2. Novas regras para Semente Salva

A prática de guardar parte da colheita para usar como semente na safra seguinte (“salvar semente”) é um direito do produtor, mas a Portaria 538/2022 trouxe regras mais claras e exigências adicionais:

  • Declaração obrigatória no Sigef: A “Declaração de Uso Próprio” deve ser feita pelo Sistema de Gestão da Fiscalização (Sigef), plataforma online do MAPA, no momento do plantio, informando a área que cultivada com a semente salva;
  • Comunicação pós-colheita: É a obrigatoriedade de informar no Sigef o peso final das sementes que foram reservadas (salvas) para o plantio seguinte. Isso deve ser feito em até 90 dias após o fim da colheita;  
  • Definição da reserva técnica: O produtor pode ter uma reserva técnica de sementes salvas de até 10% da quantidade total necessária para o plantio da área declarada, para cobrir necessidades de replantio.  
  • Transporte entre propriedades: A solicitação para transportar sementes salvas entre diferentes propriedades rurais do mesmo titular agora é feita na Declaração de Uso Próprio no Sigef;
  • Royalties e biotecnologia: Se a cultivar tiver tecnologia protegida, como transgênicos, o pagamento de royalties à empresa detentora é obrigatório;
  • Impacto no seguro rural: A Declaração de Uso Próprio é exigida para contratar o seguro agrícola. Nem todas as seguradoras cobrem lavouras com sementes salvas.

3. Análise de sementes (RAS)

O MAPA atualizou as Regras para Análise de Sementes (RAS), que definem os métodos oficiais usados por laboratórios credenciados para avaliar a qualidade física e fisiológica das sementes.

Essa atualização modernizou os métodos, se alinhando aos padrões internacionais, como ISTA e AOSA, adaptando à realidade da agricultura tropical.

Além disso, trouxe mais clareza em pontos que geravam dúvidas nos laboratórios, incluindo mudanças como:

  • Atualização dos nomes científicos;
  • Inclusão de culturas como quinoa e chia;
  • Regras mais claras para misturas de sementes;
  • Revisões nos procedimentos de amostragem.

Apesar de voltadas aos laboratórios, essas mudanças garantem resultados mais confiáveis no Boletim de Análise de Sementes — documento que comprova a qualidade dos lotes.

Diversas mãos segurando diferentes tipos de sementes crioulas, com variedade de cores, formas e tamanhos, representando a diversidade agrícola preservada por comunidades tradicionais.
Fonte: Brasil de fato

4. Avanço no controle e formalização

Essas atualizações fazem parte de um movimento maior do MAPA para reforçar o controle e a rastreabilidade do sistema de sementes.

A Portaria 538, por exemplo, detalha as exigências para o uso de semente salva e a obrigatoriedade do registro no Sigef.

Já a atualização das RAS melhora a padronização e confiabilidade das análises. Com isso, o MAPA fortalece o mercado formal, especialmente o de sementes certificadas.

Como as regras se aplicam aos diferentes tipos de sementes?

A legislação brasileira classifica as sementes em diferentes categorias, como sementes certificadas, sementes fiscalizadas, sementes S1/S2 e sementes salvas.

Cada uma delas segue regras específicas quanto à produção, comercialização e uso. Veja os detalhes abaixo:

Sementes crioulas

São variedades desenvolvidas e mantidas por agricultores familiares, assentados, indígenas e comunidades tradicionais.

Essas sementes são reconhecidas pela Lei 10.711/2003 e não podem ser transgênicas ou resultado de hibridação industrial.

A lei isenta agricultores familiares, assentados e indígenas para multiplicar, trocar ou vender sementes crioulas entre si, mas proíbe que programas públicos restrinjam o seu uso.

Mesmo com as isenções, quem cultiva sementes crioulas pode enfrentar barreiras, como a falta de acesso ao seguro agrícola, que exige cultivares registradas no RNC e no Zoneamento Agrícola.

Para resolver esse problema, o Projeto de Lei 2190/2023 propõe liberar a troca, comercialização e envio dessas sementes entre comunidades rurais e indígenas, fortalecendo a agrobiodiversidade e a autonomia desses grupos.

Sementes transgênicas

Antes de qualquer uso comercial, sementes geneticamente modificadas (transgênicas), passam por uma avaliação de biossegurança feita pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio).

A CTNBio analisa os potenciais riscos à saúde humana, animal e ao meio ambiente, emitindo um visto técnico sobre sua segurança.  

Somente após a liberação pela CTNBio é que a cultivar transgênica pode ser registrada no RNC pelo MAPA. A partir daí, sua produção e comercialização seguem as mesmas regras gerais da Lei 10.711 e as regulamentações.

Muitas sementes certificadas tem biotecnologias com resistência a pragas ou tolerância a herbicidas, sendo ferramentas importantes na agricultura moderna.  

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Sementes inoculadas

A Instrução Normativa 13/2011 do MAPA regula o inoculante, produto com microrganismos benéficos, como o Rhizobium.

A norma define especificações de qualidade, concentração mínima de microrganismos, garantias, regras para registro do produto no MAPA, embalagem e rotulagem.

A lei não regula diretamente a “semente inoculada”, mas sim o insumo que aplicado a ela, que é o responsável pela saúde da safra.

Sementes selecionadas (Categorias S1 e S2)

As sementes S1 e S2 são da classe não certificada, conhecidas informalmente como “semente fiscalizada” antes da legislação atual.  

A S1 pode ser obtida pela multiplicação de sementes da classe certificada (Genética, Básica, C1 ou C2). Já a S2 pode vir da multiplicação da S1 ou de qualquer categoria certificada.

A duas podem ser produzidas por produtores inscritos no Renasem e atender a padrões mínimos de qualidade, que são verificados por análises em laboratório.

As sementes S1 e S2 não passam pelo mesmo processo rigoroso de controle de qualidade em todas as etapas que caracteriza a semente certificada.

Na prática, isso significa que oferecem uma garantia inferior à das certificadas, especialmente em relação à pureza varietal e ao potencial genético.

Por conta disso, podem ter um custo inicial menor, mas o produtor assume um risco maior em relação ao desempenho da lavoura.  

Tipos de sementes no Brasil

CaracterísticaSemente Certificada (C1/C2)Semente Não Certificada (S1/S2)Semente CrioulaSemente Pirata
Garantia de QualidadeAlta (MAPA/Certificadora)Média (Padrões mínimos)Variável (Conhecimento local)Nenhuma
Pureza Genética/VarietalAlta (Controlada)Média (Menor controle)Variável (Adaptada localmente)Baixa / Mistura
RastreabilidadeSim (Obrigatória)LimitadaGeralmente Não (Comunitária)Não
Controle de ProduçãoRigoroso (Todas as etapas)Básico (Foco no produto final)Tradicional / ComunitárioNenhum / Ilegal
Risco FitossanitárioBaixoMédioVariávelAlto
Legalidade (Comércio)SimSim (Dentro das regras)Restrita (Entre grupos isentos)Não (Ilegal)
Potencial ProdutivoAltoMédio / AltoVariável (Adaptado ao local)Baixo / Incerto
Custo Inicial (Médio)Mais altoIntermediárioBaixo / TrocaMais baixo (aparente)

O Brasil é considerado um dos líderes globais em tecnologia de sementes, especialmente em adaptações para condições tropicais e resistência a pragas.

Grande parte desse avanço é resultado dos investimentos em pesquisa e melhoramento genético, graças ao sistema formal de produção e comercialização de sementes certificadas.

Ao optar por sementes legais e de qualidade, você não só protege sua lavoura, mas também contribui para a continuidade dessa inovação.  

Mathias Bergamin

Engenheiro Agrônomo (UFRGS, Kansas State) e especialista de Novos Negócios na Aegro. Reconhecido como referência em Agricultura Digital, especialização em administração, gestão rural, plantas de lavoura.