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Henrique Fabrício Placido - 7 de julho de 2020
Atualizado em 4 de abril de 2025
Nuvem de gafanhotos no Brasil: Entenda o contexto histórico, as principais características desses insetos e quais medidas o país tem tomado.
Você deve ter acompanhado inúmeras reportagens na últimas semanas falando sobre a nuvem de gafanhotos que se aproximava do Brasil.
Muitas exploraram até um lado sensacionalista, falando sobre devastação das plantações.
Mas será que essa nuvem realmente é um perigo iminente?
Acompanhe neste artigo o histórico das nuvens de gafanhotos no Brasil, comportamento desse inseto, situação atual da nuvem e as medidas que estão sendo tomadas pelo governo brasileiro!
Índice do Conteúdo
Ao contrário do que se imagina, essa nuvem de gafanhotos não é o primeiro acontecimento do tipo que ocorre no Brasil ou em países próximos.
O Brasil possui espécies de gafanhotos nativas que tem esse mesmo hábito migratório, por exemplo, a espécie Rhamamtocerus pictus no estado de Rondônia.
A diferença é que as espécies nativas no Brasil têm menor capacidade reprodutiva e não percorrem distâncias tão grandes.
Espécie de gafanhoto migratório presente no Brasil (Rhammatocerus pictus)
(Fonte: Agrolink)
Gafanhotos da espécie Schistocerca cancellata, presentes na nuvem atual, já tiveram ocorrência no Brasil nos anos de 1947/48.
E, por mais que apresentem grande agressividade, ainda não são tão nocivos quanto os encontrados no continente africano, por exemplo.
Nuvem de gafanhotos no continente africano
(Fonte: Hypeness)
Os gafanhotos que compõem esta nuvem, que está se movimentando próximo à região Sul do Brasil (Rio Grande do Sul e Santa Catarina), são da espécie Schistocerca cancellata provenientes da região do chaco, no Paraguai.
São popularmente chamados de gafanhotos sudamericanos.
Essa espécie, devido a padrões evolutivos, desenvolveu uma característica migratória para assegurar a sobrevivência.
Em geral, esses gafanhotos não possuem hábitos migratórios durante seu ciclo de vida. Mas, pela interação com um conjunto de fatores, alguns indivíduos se diferenciam dos demais, adquirindo características migratórias.
Quando isso ocorre, normalmente a espécie acaba migrando próximo à fronteira do Paraguai, Argentina e Bolívia.
Porém, esse ano teve uma rota diferente – o que não acontecia há 70 anos.
Ciclo de vida do gafanhoto sudamericano (Schistocerca cancellata)
(Fonte: El Diario)
Os fatores que impulsionam essa mudança de habitat são:
A principal diferença entre os gafanhotos que permaneceram no local de origem e os que iniciaram a migração está na cor. Confira suas fases de desenvolvimento na figura que eu separei:
Estádios de desenvolvimentos do gafanhoto sudamericano (Schistocerca cancellata) com características migratórias e não migratórias
(Fonte: Entomology Today)
O que realmente impressiona nesta nuvem é a quantidade de indivíduos migrantes: são cerca de 400 milhões de gafanhotos, o que equivale a uma área de aproximadamente 10 km2.
Considerando que um gafanhoto pode consumir aproximadamente duas gramas de matéria verde por dia, essa nuvem poderia consumir uma quantidade de matéria verde por dia semelhante a um rebanho com 20 mil bovinos.
Ataque do gafanhoto sudamericano a uma lavoura de milho
(Fonte: Guía Rural del Paraguay)
Esses insetos aproveitam o dia para se deslocar e, ao entardecer, pousam em uma região para se alimentar e ovipositar. Na manhã seguinte, continuam o trajeto.
Além do estrago ocasionado pela alimentação no local de pouso, cada fêmea pode ovipositar de 80 a 100 ovos no solo deste local.
Levando em consideração que cada fêmea poderá realizar até 6 posturas durante sua vida, muitos locais podem ser infestados.
O inseto insere parte do seu corpo no solo e deposita os ovos. Além disso, excreta uma substância que impermeabiliza os ovos, protegendo-os da umidade.
Postura de ovos do gafanhoto sudmericano no solo
(Fonte: Senasa)
Entre 15 e 61 dias após a deposição no solo, os ovos podem eclodir, contudo, é necessário que ocorra no mínimo 25 mm de chuva.
Assim, surgem as primeiras ninfas que, inicialmente, se desenvolveram para saltões, indivíduos menores que não possuem asas, mas que continuam saltando seguindo a trajetória da nuvem.
Por isso, é de suma importância que, além de controlar a nuvem, seja feito o controle das novas gerações de insetos provenientes dos ovos. Vou explicar melhor a seguir.
No momento que esses gafanhotos iniciam a migração, a trajetória percorrida já está previamente determinada. Em alguns momentos, são feitos desvios para utilizar as correntes de ar favoráveis e evitar condições climáticas desfavoráveis.
Alguns pesquisadores acreditam que essa trajetória seja determinada por algum tipo de atração magnética. Até o momento, porém, isso não foi provado.
Baseados nessas informações, pesquisadores da Epagri, em parceria com outras instituições de pesquisa, calcularam as possíveis rotas que a nuvem poderia adotar, conforme a trajetória já percorrida e previsões climáticas.
Previsão de movimentação da nuvem de gafanhotos sudamericanos em junho
(Fonte: Epagri)
Por isso, entendeu-se que a possibilidade desta nuvem ocasionar problemas em território brasileiro é muito baixa.
Entretanto, como medida preventiva, o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) disponibilizou uma portaria com aspectos legais e medidas de controle destes gafanhotos.
O primeiro passo importante no controle destes gafanhotos é o monitoramento. Os órgão responsáveis devem acompanhar o deslocamento da nuvem e, principalmente, demarcar os locais de pouso.
As medidas de controle recomendadas pelo Mapa são divididas em duas frentes: controle da nuvem e controle das novas gerações.
Recomenda-se que a nuvem seja acompanhada pelos órgãos responsáveis e que, ao pousar, imediatamente seja demarcado o local, determinando a área a ser tratada e como será a forma de aplicação.
Após isso, deve-se fazer um levantamento dos produtos químicos disponíveis na região, para que aplicação seja realizada na primeira hora do próximo dia.
Dependendo do local onde estes gafanhotos pousarem, algumas situações podem dificultar o manejo. Em uma área florestal, por exemplo, o método de aplicação e cobertura do alvo são mais complicados.
Assim, para auxiliar a tomada de decisão, o Mapa disponibilizou produtos que podem ser utilizados e suas dosagem para diferentes culturas. Também há recomendações para culturas que não tem esses produtos registrados.
Para ter acesso a essa recomendação, acesse o Manual de controle do gafanhoto sudamericano do Mapa.
No caso das novas gerações, após demarcação do local de oviposição, deve-se acompanhar até o momento da saída dos indivíduos da terra e determinar o trajeto que irão percorrer e as dimensões da área tratada.
Uma primeira opção seria o cultivo mecânico da área, expondo os ovos ao sol para que se desidratam. Porém, o Mapa recomenda que essa seja última opção, sendo adotada apenas em regiões onde o manejo químico não será possível.
Devido à menor mobilidade, pode-se realizar uma área menor de tratamentos, onde aplicam-se faixas de 30m a 50 metros, dependendo do sentido do vento, com intervalos de 150m a 500 metros, dependendo do estádio dos insetos, seguindo o sentido de deslocamento.
Assim, uma quantidade menor de produto é necessária e os insetos serão controlados ao se deslocarem sobre o solo tratado.
A nuvem de gafanhotos permanece na Argentina neste começo de julho, ainda na região de Corrientes (cerca de 130 km do Brasil), segundo monitoramento do Senasa (Serviço Nacional de Saúde e Qualidade Agroalimentar da Argentina).
Uma informação recente que tranquiliza os produtores brasileiros são as notícias da eficiência de controle da nuvem pelo governo do país vizinho.
Os poucos indivíduos não controlados, devido às condições climáticas, tiveram um deslocamento curto (4 km) e o governo argentino já está monitorando para finalizar seu controle.
Mesmo assim, estados do Sul do Brasil ainda mantêm alerta de risco da entrada da praga no país.
Mas o país demonstra estar preparado para controle destes invasores, caso ocorra uma nova migração.
Vimos neste texto que nuvens de gafanhotos não são um assunto totalmente novo no Brasil, que já registrou casos inclusive da mesma espécie no passado.
Entendemos algumas características que tornaram esses gafanhotos importantes, como sua alta taxa reprodutiva e alimentar. Além disso, entendemos por que esses gafanhotos têm esse hábito migratório.
Vimos que a perspectiva é que esta nuvem não chegue ao Brasil, porém, se acontecer, o governo brasileiro já estabeleceu medidas de contenção da praga.
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