As dívidas rurais fazem parte da realidade de muitos produtores. Quem trabalha no campo sabe que os custos de produção são altos, o crédito é essencial para custear a safra e qualquer imprevisto pode comprometer o pagamento.
Uma chuva fora de hora, uma praga inesperada ou até o preço baixo na hora da venda podem gerar atrasos e preocupações.
Nos últimos anos, o número de produtores buscando alternativas como prorrogação, renegociação ou até mesmo anistia de dívidas rurais aumentou bastante.
Essa procura mostra que o endividamento está mais presente no agro do que muitos imaginam. Mas é possível administrar a situação sem perder o controle e garantir que a propriedade continue produzindo.
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O que é uma dívida rural?
Uma dívida rural é qualquer compromisso financeiro que o produtor assume para manter as atividades no campo, como financiamentos, CPRs, arrendamentos ou empréstimos, por exemplo.
Ter dívida não significa estar em um situação ruim, já que o crédito se torna necessário para investir em insumos, tecnologia e expansão da produção.
O problema surge quando a dívida não é bem planejada, ameaçando o fluxo de caixa, a rentabilidade e a continuidade da atividade rural.
No 1º trimestre de 2025, a inadimplência entre produtores rurais pessoa física chegou a 7,9%, um aumento de 0,3 ponto percentual em relação ao último trimestre de 2024 e de 0,9 ponto em relação ao mesmo período de 2024.
Apesar da relevância do crédito para o agronegócio, cresce a preocupação com o endividamento e a capacidade de pagamento do setor.
Quais são as dívidas rurais mais comuns?
- Crédito de custeio: Usado para insumos, sementes, adubos e defensivos, geralmente de curto prazo;
- Crédito de investimento: Financiamentos de máquinas, equipamentos, estruturas e até sistemas de irrigação, com prazos mais longos;
- CPR (Cédula de Produto Rural): Muito utilizada para antecipar recursos, atrelada à entrega futura da produção;
- Contratos com fornecedores: Compras a prazo de insumos e serviços diretamente com distribuidores e cooperativas;
- Arrendamentos e parcerias: Compromissos assumidos no uso da terra de terceiros;
- Empréstimos informais: Realizados entre produtores ou familiares, sem contrato bancário.
Essas modalidades variam em prazo, juros e garantias, mas todas exigem acompanhamento rigoroso para não se acumularem além da capacidade de pagamento.
Segundo o Banco Central, em 2024 o saldo das operações de crédito rural ultrapassou R$ 1,3 trilhão, evidenciando a importância do crédito para o setor, mas também o risco de endividamento quando mal administrado.

Como prorrogar as dívidas rurais?
A prorrogação de dívidas rurais é o direito do produtor de pedir mais prazo quando acontecem situações fora do controle, como seca, enchente ou queda forte de preços.
Esse pedido deve ser feito diretamente no banco em que o crédito foi contratado, com a apresentação de laudos, documentos e registros que comprovem a dificuldade.
Normalmente, sindicatos rurais e cooperativas podem ajudar nessa comprovação.
Em 2024, por exemplo, muitos produtores recorreram à prorrogação de dívidas rurais por causa de quebras de safra em diferentes regiões do Brasil. Esse recurso tem sido cada vez mais utilizado como forma de preservação da atividade agrícola.
Além disso, é bom lembrar que a prorrogação não é automática: cada caso passa por análise da instituição financeira.
Você ainda deve avaliar também os impactos no fluxo de caixa, já que, embora o prazo aumente, os juros continuam sendo cobrados. Por isso, contar com orientação de um contador ou consultor de gestão pode fazer diferença na negociação.
Como funciona o alongamento de dívidas rurais?
O alongamento de dívidas rurais é parecido com a prorrogação, mas em vez de apenas estender a parcela, você pode redividir a dívida em prazos maiores. Isso ajuda a reduzir o valor das parcelas e dar mais fôlego ao caixa.
Esse recurso é útil em financiamentos de maior porte, como aquisição de máquinas, implementos, equipamentos ou investimentos em infraestrutura, quando a capacidade de pagamento fica comprometida por mais de um ciclo agrícola.
Quem estiver passando por alguma situação em que o alongamento de dívidas seja necessário, é possível solicitar da seguinte forma:
- Apresentar à instituição financeira um relatório detalhado da situação financeira, mostrando a dificuldade de cumprir as parcelas no prazo original;
- Fornecer documentos que comprovem perdas ou quedas de receita, como laudos de quebra de safra, notas fiscais ou registros de vendas;
- Negociar junto ao banco novos prazos, juros e condições, garantindo que o alongamento seja viável para ambos os lados.
Como funcionam os prazos, registro e juros da CPR?
A Cédula de Produto Rural (CPR) é um dos instrumentos de crédito mais utilizados no campo e pode assumir duas formas principais: a CPR física, vinculada à entrega futura da produção, e a CPR financeira, em que a liquidação ocorre em dinheiro.
O prazo da CPR varia conforme o contrato. Em operações financeiras, ele pode chegar a até 36 meses, enquanto na CPR física costuma acompanhar o ciclo da lavoura, geralmente limitado a uma safra.
Desde 2020, todas as CPRs precisam ser registradas em entidades autorizadas pelo Banco Central, e o prazo para esse registro é de até 10 dias úteis após a emissão do título.
Sem esse procedimento, o documento perde validade perante terceiros e não pode ser executado em caso de inadimplência.
Já em relação aos custos, a taxa de juros da CPR depende da negociação. Quando emitida diretamente com tradings ou empresas de insumos, o custo muitas vezes está embutido no preço final do produto.
Nas operações financeiras, os juros podem acompanhar a Selic ou outros índices de mercado, variando em média entre 12% e 18% ao ano, podendo ser maiores em períodos de crédito restrito.

Como renegociar dívidas e contratos antes do novo plantio?
O ideal é renegociar as dívidas e contratos rurais com os bancos e fornecedores, apresentar a real situação financeira e buscar alternativas, como alongamento de prazos, descontos em juros ou até abatimento de parte da dívida.
Muitos credores preferem renegociar a receber algo de forma segura do que correr o risco de inadimplência. Além disso, é importante:
- Organizar toda a documentação: Demonstrativos financeiros, contratos antigos e comprovantes de receitas e despesas;
- Avaliar prioridades: Identificar quais dívidas precisam ser quitadas primeiro e quais podem ser alongadas;
- Contar com apoio técnico: Consultores, softwares de gestão financeira, contadores ou sindicatos rurais podem ajudar a organizar e negociar melhores condições.
Essa renegociação ajuda a planejar melhor os investimentos da nova safra, evitando que você entre em um ciclo vicioso de dívidas acumuladas e garantindo maior segurança para a continuidade da atividade agrícola.
Quando a dívida rural pode virar um problema?
A dívida rural se torna um problema quando começa a comprometer a capacidade de produção e a saúde financeira da propriedade. Alguns sinais de alerta incluem:
- Uso de todo o faturamento apenas para pagar dívidas: Quando não sobra capital para investir em insumos, sementes, defensivos, mão de obra ou manutenção de máquinas, a produção corre risco;
- Acúmulo de parcelas vencidas: Atrasos repetidos podem gerar multas, juros altos e cobranças judiciais ou protestos em cartório, prejudicando o crédito do produtor;
- Dificuldade de acesso a novos financiamentos: Bancos e fornecedores podem se tornar mais restritivos, dificultando a aquisição de crédito necessário para a próxima safra;
- Impacto no planejamento da safra seguinte: Dívidas mal controladas comprometem decisões estratégicas, como escolha de culturas, investimento em tecnologia e expansão da propriedade;
- Risco de endividamento crônico: Quando a dívida cresce mais rápido que a receita da fazenda, entra-se em um ciclo vicioso que pode levar à insolvência.
Por isso, é importante acompanhar o fluxo de caixa, planejar os pagamentos e renegociar dívidas sempre que necessário.
Com gestão e estratégia, o crédito continua sendo um aliado do crescimento, em vez de um risco para a continuidade da produção.
Existe risco de perder a propriedade por conta de dívidas?
Sim, existe risco de perder a propriedade por conta de dívidas. Em casos de inadimplência grave, a fazenda pode ser usada como garantia em financiamentos ou até ser penhorada em processos judiciais.
Esse risco aumenta quando não há negociação e as dívidas acabam no Judiciário. Além disso, a inadimplência pode gerar outros problemas, como:
- Bloqueio de contas bancárias e ativos;
- Multas e juros acumulados, aumentando ainda mais o valor devido;
- Dificuldade de obter crédito futuro, prejudicando investimentos na próxima safra;
- Impacto na sucessão familiar, caso o patrimônio esteja em nome de diferentes membros da família.
Procure renegociar dívidas antes que a situação fuja do controle para proteger o patrimônio, manter a produção e, principalmente, preservar a saúde financeira da fazenda.
Como a gestão financeira pode evitar o endividamento excessivo?
Grande parte dos problemas com dívidas rurais pode ser evitada com uma gestão financeira eficiente. Antes de buscar qualquer crédito, planeje todos os custos da safra, incluindo insumos, mão de obra, manutenção de máquinas e possíveis imprevistos.
Ter esse planejamento claro, seja por planilhas ou software, permite saber quanto dinheiro será necessário e evita contrair empréstimos desnecessários ou mal dimensionados.
Manter registros detalhados de receitas e despesas é outro passo importante. Com dados atualizados, você visualiza para onde o dinheiro está indo, identifica gastos excessivos e toma decisões mais conscientes sobre investimentos e cortes necessários.
Além disso, acompanhar indicadores de mercado e definir estratégias de venda ajuda a escolher os melhores momentos para comercializar produtos e negociar preços, aumentando a margem de lucro e evitando endividamento por falta de receita.
Junto disso, recomendamos que crie reservas financeiras para garantir capital próprio para emergências e reduzir dependência de bancos.
Por fim, revisar periodicamente contratos e dívidas existentes, e utilizar ferramentas de controle financeiro ou softwares de gestão rural contribui para consolidar informações, gerar relatórios claros e facilitar a tomada de decisões estratégicas.
Com essas práticas, o crédito deixa de ser uma armadilha e passa a ser um aliado para o crescimento sustentável da fazenda, protegendo a produção e a saúde financeira do negócio.


Daniel Oliveira
Formado em Ciências Contábeis, pós-graduado em gestão financeira, Mestre em Contabilidade e finanças pela UFMG, Doutorando em Economia aplicada pela USP Esalq.