Atualizado em 04 de agosto de 2020.
Pós-colheita do café: como ela pode contribuir para a qualidade da bebida e quais cuidados tomar com a lavoura nesta fase.
A fase de pós-colheita do café é crítica para a qualidade da bebida (e também de sua rentabilidade)!
São várias as opções de processamento e, portanto, pode-se obter cafés dos mais variados tipos e qualidades.
Mas de nada adianta caprichar na colheita e errar no processamento de café depois dela!
Confira comigo algumas perspectivas, além de alguns cuidados essenciais com a lavoura de café nessa época.
Índice do Conteúdo
A pós-colheita do café
A pós-colheita do café compreende as etapas de processamento e armazenamento do café.
Enquanto no armazenamento as recomendações são bem definidas, no processamento existe uma infinidade de opções disponíveis.
Essas dicas são aplicáveis para café arábica e robusta, embora ainda não haja um mercado que priorize a qualidade do segundo.
Como veremos a seguir, a escolha por um ou outro método depende do objetivo de cada produtor. É um mundo a ser explorado.
A qualidade do café
A qualidade do café é estabelecida lá na roça. Ela é definida por características como o tamanho, cor e integridade do grão, além da qualidade na xícara, é claro.
Isso é fruto de uma interação complexa entre variedade, clima, manejo da lavoura, processo de colheita e pós-colheita.
O clima é próprio do local, não temos controle sobre ele – muito embora variações climáticas entre os anos possam alterar a qualidade.
Todo o resto – variedade, manejo, colheita e pós-colheita – são decisões do produtor:
A escolha da variedade, nutrição, controle de pragas e doenças, a colheita de frutos cereja e uma pós-colheita adequada devem ser bem avaliados se quisermos produzir com qualidade.
O processamento de café
É recomendável que se comece a processar o café logo após a colheita, para evitar perdas e manter a qualidade!
Mas… a pós-colheita cria qualidade? Essa pergunta é muito comum. Então, vamos esclarecer as coisas:
A pós-colheita não cria qualidade. Embora não a crie, ela pode alterar ou destruir a qualidade do café.
Etapas do processamento de café

(Fonte: QNInt)
Um bom processamento é fundamental para a qualidade do produto, mas dentre as etapas do processamento, a maioria apenas preserva a qualidade ou retira impurezas/defeitos.
Somente as etapas de despolpamento, remoção da mucilagem e secagem alteram a qualidade. Essas etapas afetam diretamente a qualidade do café na xícara, alterando corpo, aroma, acidez, além de outras características.
Devido a esse efeito sobre a qualidade do café, existem inúmeras possibilidades de atuar sobre essas etapas. Vou explicar a seguir:
Possibilidades do processamento de café
Há um mundo de possibilidades à nossa disposição para cafés especiais. A ideia é passar alguns pontos básicos, afinal, esse assunto é extenso e, para cada realidade, uma técnica pode se encaixar melhor que outra.
Não existe uma decisão perfeita, nesse caso. Cada tipo produz cafés diferentes de um mesmo café colhido. Tudo dependerá do mercado que se deseja atender. Também podemos optar por fazer vários tipos na propriedade.
Mas, antes de tudo, devemos optar pela separação dos frutos maduros dos cafés verdes. A partir daí, temos alguns caminhos a seguir:
Despolpar ou não? Os cafés naturais
Podemos optar pelo processamento dos frutos via seca, sem despolpamento, obtendo cafés naturais. Nesse caso, os café são secos com “casca e tudo”, como na figura abaixo.

(Fonte: Ensei Neto – Paladar Estadão)
A bebida gerada pelos cafés naturais geralmente tem maior corpo e doçura, pois os grãos de café absorvem mais características do fruto. Esse tipo de processamento de café é bastante utilizado no Brasil.
Despolpamento
Ao despolpar o café, temos um dilema: removo a mucilagem ou não? Quanto removo? Depende!
Existe uma variedade de cafés que podemos produzir a partir disso, cada qual com uma característica diferente.
Com o despolpamento, removemos a casca e obtemos outros tipos de café, como o cereja descascado (CD) ou os cafés desmucilados/lavados.
Ao despolpar, também é possível separar os frutos verdes, regulando o despolpador para que eles não sejam despolpados e se misturem.
Cereja descascado
O cereja descascado seria um meio termo entre o natural e o desmucilado, pois retira-se a polpa (casca) mecanicamente, mas o café é colocado para secar com toda ou alguma mucilagem.
Assim, o cereja descascado seca mais rápido que o natural e tem bebida mais encorpada que os desmucilados.
É bom ressaltar que o cereja descascado é uma inovação do processamento de café nacional, mas que depois foi adotado como outro nome em outros países, os tais “honeys”, o que particularmente tem grande apelo no mercado internacional de cafés.

(Fonte: Di Bartoli)
Cafés desmucilados ou lavados
O processo de remoção de mucilagem pode ser feito com uso de desmucilador (remoção mecânica) ou com a fermentação dos grãos (com ou sem água).
Geralmente, o café que resulta desse processamento tem menos corpo e acidez pronunciada.
Fermentação de cafés
É bom lembrar que fermentações podem ocorrer naturalmente nos cafés colhidos ou ainda no pé. Mas aqui vamos tratar das fermentações controladas, que têm mostrado bons resultados para cafés especiais.
Esse tipo de processamento de café pode ser feito em tanques de fermentação específicos, mas muitos acabam optando por colocar naquelas bombonas de 200l.
Para consistência no processo, é necessário que se monitore a temperatura, pH, brix, tempo de fermentação e outros parâmetros. Se não, é apenas sorte e talvez não se obtenha aquele café novamente.
É importante lembrar que podem ocorrer fermentações indesejadas, que acabam com o café. Por isso, alguns parâmetros devem ser respeitados.
Geralmente queremos fermentações anaeróbicas (sem oxigênio no tanque), portanto, não podemos deixar que o oxigênio entre e cause problemas.
Por isso, colocam-se “air lockers” na tampa do fermentador para evitar a entrada. Pode ser feita uma versão caseira com basicamente um pedaço de mangueira e uma garrafinha.

(Fonte: Blog do Breda)
Além disso, o tempo máximo de fermentação deve ficar entre 48h e 72h dependendo da temperatura do local, pois fermentações indesejadas podem ocorrer fora desse período.
Respeitadas essas regras, temos mais liberdade para sermos criativos. Tem gente fermentando café com polpa de maracujá, com leveduras de cerveja, de vinho… Em cada caso obtém-se um perfil sensorial para um mesmo café!
Por isso, as oportunidades para o produtor são imensas e o mercado está aceitando novos cafés. Fique atento e não tenha medo de fazer testes em lotes pequenos!
Secagem do café
Assim como nas etapas anteriores, temos mais de um caminho a seguir na fase de secagem do café. Podemos optar pela secagem ao sol, como tradicionalmente se faz em terreiros ou optar por secadores rotativos ou secagem à sombra.

(Fonte: Canal Rural)

(Fonte: Pinhalense)
Uma nova tendência (nova pelo menos aqui no Brasil) é o uso de terreiros suspensos, como as chamadas camas africanas. Nesse caso, eles podem ficar ao sol ou à sombra. Veja:

(Fonte: Perfect Daily Grind)
Se o objetivo é rapidez, talvez o secador seja a melhor opção.
Se o volume é muito grande, talvez valha usar o terreiro.
Mas, caso o foco seja a qualidade, resultados promissores vêm sendo obtidos com terreiros suspensos.
A circulação de ar nos terreiros suspensos é facilitada, evitando fermentações indesejadas. Além disso, como está afastado do solo, menores são os riscos de contaminação.
A torra do café
A torra do café deve ser realizada o mais próximo da venda possível, isso porque após esse processo podem haver perdas de qualidade do grão.
Uma torra errada pode pôr a perder todo o trabalho, desde a lavoura até o pós-colheita e processamento de café. Dito isso, é necessário que a torra seja uniforme, sem passar do ponto.
O sabor do café é definido pela interação entre o processamento em si e a torra. Existem basicamente três tipos de torra e cada uma pode ser escolhida para satisfazer determinada necessidade ou bebida que se deseja obter.
- Torra clara: produz menos amargor nas bebidas, que ficam suaves, com acidez acentuada e menos encorpadas. Bom para café expresso.
- Torra média: cafés mais equilibrados, com mais corpo. Geralmente dão melhores resultados para cafés coados.
- Torra escura: cafés menos ácidos e encorpados, com amargor – o tal do café forte. Cuidado para não torrar demais.

(Fonte: Grão Gourmet)
Logicamente, entre esses três tipos básicos de torra podem existir nuances e variações. Fica a critério seu qual utilizar.
A qualidade como diferencial de mercado
Em tempos de baixos preços pagos pelo café, como os atuais, a busca pela qualidade pode ser uma solução para o cafeicultor.
Enquanto o mercado é inundado com cafés comerciais de qualidade, há todo um mercado de cafés especiais e diferenciados à espera.
Os compradores nesses mercados prezam pela qualidade do café e fidelidade do produtor, e, por isso, estão dispostos a pagar muito mais pelo produto.
Podem pagar desde algumas centenas a mais pela saca até algumas centenas de reais pelo quilo, no caso dos especiais. O céu é o limite, nesse caso.
Como vimos, a qualidade de um café é complexa.
Portanto, o produtor que quiser a qualidade como um diferencial do café deve planejar cada passo, desde da escolha da variedade até – e principalmente – seu pós-colheita e processamento.
Armazenamento do café
Existem regras e recomendações para o armazenamento de cafés bem estabelecidas.
Contudo, o mercado de cafés especiais e novas técnicas de processamento podem alterar isso.
Tradicionalmente, o café é armazenado em sacaria de juta ou em big bags. Mas, embora possamos controlar o ambiente do armazém, perdas de qualidade são inerentes ao processo.
Ao longo de um ano de armazenamento, por exemplo, um café pode deixar de ser especial devido a essas perdas.
Assim, há uma tendência em buscar novas embalagens ou uso de atmosfera modificada para o armazenamento de cafés especiais.
São novas tendências e possibilidades! Cada qual pode atender a um nicho distinto, mas com certeza veremos algumas novidades neste sentido nos próximos anos.
Cuidados com a lavoura após a colheita do café
Nosso café já está colhido e sendo processado, logo estará pronto para a venda. Mas o que fazer com a lavoura após a colheita?
Primeiramente, devemos fazer a varrição, para coletar os grãos caídos e evitar que a broca se multiplique.
Próximo ao término da colheita, também devemos realizar as podas. O tipo de poda adequado deve se indicado por um engenheiro agrônomo. Aqui no blog nós já falamos sobre a “Poda do cafezal: Como fazer para aumentar sua produção”. Confira!
Monitore o ataque de pragas e doenças do cafeeiro e realize as aplicações caso seja necessário.
Fique atento também aos danos causados pelas podas, os quais facilitam a entrada de patógenos. Nesses casos, pode-se fazer o uso de cúpricos.
Conclusão
Como pudemos conferir, a qualidade do café é fruto da interação de alguns fatores, dentre eles o pós-colheita.
O pós-colheita do café pode não criar qualidade, mas pode mantê-la ou alterá-la.
As várias opções disponíveis permitem que um mesmo produtor tenha diversos tipos de café em sua propriedade e devem ser vistas com uma oportunidade de diferencial para o nosso café.
Além disso, não podemos nos esquecer de cuidados importantes com a lavoura após a colheita. Isso possibilitará o bom desenvolvimento e uma melhor safra seguinte!
Leia mais
“Florada do café: Cuide bem das flores e colha bons frutos“
“Adubação para café: Simples e prática (+ planilha)“
E você, amigo, como é sua pós-colheita do café? Já pensou nas várias opções que podemos seguir? Deixe sua dúvida ou comentário abaixo. Grande abraço e até a próxima!
Sou produtor de cafe conilon como Fasso para produzir e vender cafe de qualidade
Olá, Leonardo, tudo bem?
Algumas práticas como a colheita com menos de 20% de frutos verdes e a secagem em lotes separados podem te ajudar a obter um café com maior qualidade. Mas ainda não há um mercado forte para o Conilon de qualidade. Você tem que avaliar o custo benefício para investir nisso, pois talvez não te paguem mais por essa qualidade superior. Qualquer dúvida seguimos à disposição.
Abraço.